A importância da ludoterapia na internação hospitalar de crianças: uma perspectiva psicanalítica

Introdução

A hospitalização infantil é um período marcado por angústias, medos e rupturas na rotina da criança, podendo desencadear sofrimento psíquico significativo. Nesse contexto, a ludoterapia surge como uma ferramenta terapêutica essencial, permitindo que a criança elabore suas vivências emocionais por meio do brincar. Sob a ótica psicanalítica, o lúdico não é apenas uma distração, mas um discurso simbólico que revela conflitos inconscientes e auxilia na adaptação ao ambiente hospitalar. 



 

O brincar como linguagem do inconsciente

Para a psicanálise, o brincar é uma forma de expressão do inconsciente. Melanie Klein (1929) destacou que, através do jogo simbólico, a criança projeta suas ansiedades, fantasias e mecanismos de defesa. No hospital, onde a criança enfrenta situações como dor, separação dos pais e procedimentos invasivos, o brincar oferece um espaço de elaboração psíquica, transformando o sofrimento em narrativa lúdica. 

 

Funções da Ludoterapia no Ambiente Hospitalar

1. Auxílio na elaboração de traumas e medos:  A criança revive situações de estresse (como injeções ou cirurgias) em um contexto controlado, reorganizando suas emoções. 

 2. Restabelecimento da autonomia: A internação muitas vezes impõe passividade. O brincar devolve à criança a sensação de controle, essencial para seu desenvolvimento emocional. 

 3. Facilita a comunicação: Muitas crianças não verbalizam seus sentimentos diretamente. O jogo e o brincar permite que o terapeuta acesse conteúdos inconscientes daquele sujeito e ofereça acolhimento das angústias vivenciadas no ambiente hospitalar. 

 4. Prevenção de Sequelas Psicológicas:  A hospitalização prolongada pode gerar traumas futuros. A ludoterapia ajuda a evitar fixações patológicas, como fobias ou regressões.  Ela também auxilia nas resistências que podem ocorrer frente aos procedimentos muitas vezes invasivos que elas são submetidas.

 




A atuação do psicoterapeuta na Ludoterapia Hospitalar

O profissional deve criar um setting adaptado, utilizando brinquedos que simulem o contexto médico (bonecos, kits de médico, fantasia) para facilitar a representação. A escuta psicanalítica é fundamental: o terapeuta observa repetições, simbolismos e rupturas no brincar, intervindo de forma a nomear afetos sem interpretações prematuras. 

 Ele é também responsável por estabelecer um elo entre paciente, sua família e a equipe. Partindo, não de um lugar de "liderança", mas de um lugar de envolvimento das partes necessárias para que o processo de hospitalização aconteça da melhor forma possível!

Dentro desse contexto, o psicólogo pode utilizar-se da técnica terapêutica da psicoeducação para envolver os genitores à realidade da internação.

Conclusão

Peres conclui que "o papel do psicólogo ganha destaque na atuação dentro da internação hospitalar pediátrica, relacionando-se com a necessidade de atentar-se aos aspectos emocionais da criança durante este período" (p.11).

A ludoterapia em contextos hospitalares, sob a perspectiva psicanalítica, não é um mero passatempo, mas uma técnica. Através do brincar, a criança transforma a experiência traumática em algo assimilável, fortalecendo seus recursos internos para lidar com a doença e a hospitalização. Investir nessa prática é humanizar o cuidado médico e garantir que a infância não seja apenas preservada, mas também ressignificada diante da adversidade.

 

Referências

- FREUD, S. “Além do principio do prazer” (1920). 

- KLEIN, M. “A Psicanálise de Crianças” (1932). 

- WINNICOTT, D. W. “O Brincar e a Realidade” (1971). 

Peres, C. N., Amaral, A. M., Silveira, G. B., Antoniazzi, M. P., & Volmer, A. L. (2024). A prática psicológica e a ludicidade na hospitalização pediátrica: relato de experiência. Revista Psicologia, Diversidade e Saúde, 13, e5367. http://dx.doi. org/10.17267/2317-3394rpds.2024.e5367

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